A roça Monte Café costuma ser indicada como o lugar onde a tafua surgiu e, pela maioria das pessoas, como o sítio onde existiu e, até agora existe, o único grupo de tafua. Recentemente, encontrei informações sobre a existência de grupos de tafua noutros lugares da ilha [1].
Entre os trabalhadores contratados na roça de Monte Café havia angolanos, moçambicanos e cabo-verdianos. Foi entre os primeiros e os seus descendentes que apareceu a tafua. Existia já na primeira metade do século XX, o que afirma um dos membros mais velhos dos habitantes da roça, sublinhando, ainda, a sua delimitação espacial, que explica indicando a origem étnica e do mesmo lugar dos angolanos que foram levados para esta roça: “Eu quando nasci (1938), já encontrei tafua. Tenho 80 anos. Tafua só há em Monte Café. Noutro sítio não. (…) São angolanos, mas são da outra região. Falam ngola, mas diferente. São de outro lado. O meu pai é Cokwe e a minha mãe é de Bailundo” (Entrevista 51.2019). Inicialmente restrita ao círculo de angolanos e seus descendentes, ao longo de décadas tornou-se numa manifestação comum a trabalhadores de várias origens, conquanto sempre referida como originária de Angola ou criada pelos ditos angolanos. Só relativamente tarde foi conhecida fora da roça, talvez pouco antes da independência.
Antigamente, o grupo de tafua era mais numeroso do que atualmente. Um descendente de angolanos recordou que, antes da independência, o grupo chegou a contar com 12 tocadores e 30 dançarinos. Tinham 6 instrumentos de percussão e, como a execução se prolongava por horas, os tocadores, sempre homens, iam rodando. Todos os instrumentos utilizados eram, e continuam a ser, de percussão. Os membros do grupo de tafua atualmente existente em Monte Café afirmam a continuidade dos instrumentos, lamentando somente o facto de existirem cada vez menos pessoas capazes de os construir. Existem três tipos de membranofones: mussumba (o mais pequeno, coberto com pele de boi), tambor (pele de cabra e madeira de abacateiro) e bombo (madeira uba e pele de cabra) e dois idiofones: chocalho (feito de vime, com diferentes sementes, entre as quais a sarakonta) e reco-reco (bambu e um pauzinho, também de bambu, que serve para gerar o som).
A dança é simples, não tem muitas variações: os dançarinos criam uma roda à frente dos tocadores. Prevalecem mulheres que balançam ao ritmo de tambores, dançando numa roda. Os homens juntam-se a eles, quando param de tocar para descansar, substituídos pelos outros. As letras de músicas são criadas por vários membros do grupo, sempre numa espécie de kimbundo local [1]. Os membros do grupo que não têm origem angolana sem dificuldade aprendem e interpretam as músicas, como explicam: “Desde que ele nasceu aqui connosco, ele entende. Falam melhor que próprios angolanos” (Entrevista 51.2019). Isto indica que, assim como a puíta, a tafua ultrapassou as fronteiras do grupo que a criou. Apesar de se afirmar que foram os angolanos e os seus descendentes que deram início a esta manifestação musical, com recurso a memórias sublinha-se que, ainda durante o período colonial, os trabalhadores de outras origens, particularmente cabo-verdianos, se juntavam ao grupo. Após a independência, a tafua começou a ser aparentemente a dança de todos os habitantes deste lugar.
[1] O trabalho de pesquisa encontra-se em curso e, em breve, as novas abordagens sobre esta manifestação musical irão ser partilhadas.
[2] Uma espécie de pidgin, com prevalência de palavras em kimbundo, provavelmente o pidgin de Monte Café.
[Extrato do livro Dêxa puíta sócó(m)pé. Música em São Tomé e Príncipe: do colonialismo à independência de Magdalena Bialoborska Chambel]
Entrevistas
Entrevista 04.2013, São Tomé, 28.08.2013
Entrevista 19.2014, Lisboa, 8.10.2014
Entrevista 51.2019, Monte Café, 27.01.2019
Entrevista 52.2019, São Tomé, 28.01.2019
Bibliografia
Chambel, Magdalena Bialoborska (2022), Dêxa puíta sócó(m)pé. Música em São Tomé e Príncipe: do colonialismo à independência, Lisboa, Centro de História da Universidade de Lisboa.